Marchetaria gnóstica

Davi de Carvalho, um dos filhos de Olavo de Carvalho, é artista plástico dedicado à arte da marchetaria. Suas obras fazem algum sucesso entre os seguidores do pai. O artista mantém uma página para divulgação de seu trabalho no Facebook.

Vejam melhor a foto do perfil, um dos quadros criados por Davi:

Aqui o artista aparece segurando sua obra:

Dos comentários a essa foto no Facebook:

O quadro de Sandro Botticelli a que ele se refere é A Primavera, da segunda metade do século XV:

De acordo com o site da Mediateca di Palazzo Medici Riccardi, dedicada ao palácio onde a obra se encontrava originalmente:

Uma das [interpretações] propostas com maior credibilidade foi oferecida por Ernst Gombrich (1985)... De acordo com o historiador da arte, a composição se refere à filosofia neoplatônica, e em particular aos escritos de Marsilio Ficino, que, em 1481, escreveu uma carta ao pupilo Lorenzo di Pierfrancesco na qual ele recomendava ao jovem que tomasse Vênus como sua guia espiritual, como uma alegoria de Humanitas ou educação humanística. Na pintura, a figura principal é, de fato, a própria Vênus...

Ora, Ficino e seu discípulo, Pico della Mirandola, eram mais do que meros "neoplatônicos": foram os fundadores da "cabala (dita) cristã". Quanto ao planeta Vênus, ele possui duas fases, sendo uma delas como a "estrela da manhã" ou, em grego, Phosphoros, o "portador da luz", termo que, em latim, nos deu Lúcifer, daí a identificação bíblica de Vênus, ou a Estrela da Manhã, com Lúcifer ou Satã. Dessa identificação simbólica advém o culto gnóstico a Maria Madalena como "Maria Lucifera". 

Isso lhe parece "Nova Era" demais para o membro de uma família ligada ao sofisticadíssimo perenialismo? Pois essa escola vai pelo mesmo caminho, como se lê em "Three Marys", um importantíssimo texto de um perenialista que estabelece a relação entre as 3 Marias que aparecem nos relatos do Novo Testamento com a tradição esotérica do culto à suposta manifestação tripla do Eterno Feminino. Recomendo especial atenção à nota 11, onde essa crença e prática gnóstica é relacionada a Vênus. 

O culto esotérico e herético às "Três Marias" nada mais é do que a adaptação ao cristianismo do culto às 3 Shaktis do hinduísmo - Saraswati, Lakshmi e Parvati -, também presente no culto esotérico de origem pré-islâmica às "3 Filhas de Alá" - as deusas pagãs al-Lat, al-Uzza e Manat -, assunto dos "Versos Satânicos" de Salmon Rushdie e que sobreviveu de forma subreptícia no sufismo. 

Agora não fica muito difícil entender por que o filho de Olavo de Carvalho, um perenialista confesso (será que o Mídia sem Máscara tirará esse link do ar?), escolheu reproduzir, da obra de Botticelli, exatamente as três musas, que, em um outro comentário à sua foto acima, são identificadas, a exemplo das "3 Filhas de Alá", como sendo as "3 Filhas de Zeus":

O comentário foi "curtido" pelo próprio Davi, o que sugere sua aprovação:

Não se enganem: vinda de perenialistas, qualquer referência à Virgem Maria, a Maria Madalena, a musas ou deusas não passa de uma exaltação escamoteada do que eles acreditam ser o "Eterno Feminino", mas que a tradição cristã considerou melhor relacionar a Lúcifer e chamar de "Estrela da Manhã", ou simplesmente de "Prostituta da Babilônia".