Ser um legitimista é, acima de tudo, ser alguém que enfrenta o futuro com confiança, lastreado pela segurança que o aprendizado do passado dá e com os pés bem assentes no presente. É o contrário de se ser um liberal-monárquico, ou seja, alguém que ainda acredita, após duzentos anos de fracassos acumulados, num regime surgido de um exercício de pura abstracção de um teórico pouco perspicaz e imposto a vários povos pela força das armas e pela sedução exercida nas elites pensantes - e pouco dadas ao trabalho - pelo dinheiro.
O que têm a propor os liberais-monárquicos a não ser, em termos prácticos, a troca de um presidente pelo rei, chegando ao ridículo de usarem como principal argumento em prol do seu fetiche a comparação dos gastos oficiais da presidência da república portuguesa com os gastos directamente atribuídos ao erário espanhol com a sua casa dicta real? Para além de falarmos de valores irrisórios nos orçamentos das duas nações (e de se ignorar os meios pelos quais o velho Dom João Carlos chegou à posição de oligarca – vide Cintra Concessiones), o que mostra bem a dificuldade que os liberais, supostamente mestres da ciência económica, possuem com os números, ele vale ainda mais para o legitimismo pois nele a casa reinante há de se sustentar com os bens da coroa.
Quanto aos legitimistas, posso garantir que as discussões são elevadas, transcendendo de largo o mundo de caras, e as propostas são concretas, escapando ao nível dos chavões que caracterizam o movimento liberal-monárquico. Sendo assim, senti a necessidade de escrever um bocado sobre o que poderia vir a ser o sector bancário e a organização monetária num quadro legitimista, sem contudo dizer que esse é o único modelo que se adequa a ele ou defendido nas fileiras legitimistas. A flexibilidade inerente ao foralismo permite não apenas uma diversidade de opções fechadas a quaisquer outras alternativas, mas sobretudo a diferentes combinações das mesmas no quadro da nação se tivermos atenção aos direitos inerentes aos municípios.
Em primeiro lugar, falemos daquilo que é consensual. A saída do euro e a emissão de uma moeda nacional são o primeiro passo para que os portugueses voltem a ser proprietários do seu destino, e a moeda deverá ser lastreada em ouro para que não se repitam os confiscos discretos por parte da autoridade central que a desindexação das moedas ao ouro, ou a qualquer outro metal precioso, permitem. Para aumentar as salvaguardas em relação a abusos, o pagamento de impostos ao estado central, que em particular defendo que só possa lançar impostos indirectos e consentidos nas cortes (que não serão, de modo algum, um órgão permanente que monopolize o poder legislativo), deveria ser feito exclusivamente na moeda por ele emitida e, mais importante, essa moeda não terá o curso forçado por leis monopolistas.
Tal possibilidade permitirá que os portugueses possam escolher a moeda que usam nas suas transacções e no entesouramento das suas economias, exercendo uma pressão benéfica sobre as contas públicas e sobre a saúde da moeda. Serão, ao contrário do que se passa hoje, os próprios funcionários da autoridade central os que mais zelarão pelas contas públicas pois quem pagará pelos excessos serão exclusivamente os funcionários públicos pagos na moeda emitida pelo próprio. Nada impede que os municípios, bancos e grupos de investidores também emitam moeda, submetidos à lei e aos controlos naturalmente exercidos por um mercado realmente livre - no liberalismo, essa liberdade existe apenas em teoria - e aceitem depósitos em qualquer divisa ou metal precioso. Para além das leis e da concorrência entre as divisas, outras formas de protecção do homem comum contra as formas ocultas de confisco (inflação) pode ser oferecida pelos próprios bancos, num quadro onde a banca seja descentralizada e os actuais grande grupos que dominam o sector em Portugal sejam quebrados, o que não é difícil (basta expor as suas contas aos cidadãos e não fazer mais nada e não ser esperar a falência, nacionalizá-los e depois os vender fragmentados).
Dentro das possibilidades abertas, está a de se constituírem bancos especializados no câmbio das moedas que funcionarão como o famoso Suffolk Bank estudado pelo economista Murray Rothbard. Com um sector bancário fragmentado e submetido a diversos controlos que se complementam, as crises bancárias teriam um fim e os problemas com bancos que descumprissem os critérios mínimos de sustentabilidade seriam reduzidos e, quando acontecessem, insignificantes, jamais podendo colocar toda uma nação, ou sequer uma zona do país, em perigo.
Mas as vantagens não acabam por aqui. Com um sector bancário desse tipo, podemos atrair centenas de milhares de milhões de euros e dólares e milhares de toneladas de metais e pedras preciosas para cá, oferecendo uma segurança ao investimento que mais ninguém pode dar. A longo prazo, podemos vir a nos transformar na clearing house do mundo, precificando as moedas de acordo com o seu valor real, o que nos dará o poder de quebrar o actual sistema financeiro mundial, que mais não é do que um grande cartel. Até lá, os ganhos serão muitos e suficientes para que deixemos de conversas tolas do tipo "é preciso trazer mais turistas para Portugal", como se os trocos que traz o turismo compessassem o facto dele transformar a nossa casa numa porcaria de um bazar!
Aparte um grande banco nacional emissor, a banca comercial deverá ser fragmentada a nível municipal, impedindo a formação de bancos que actuem em todo o território e cujo poder possa colocar em causa o complexo equilíbrio de poderes de um quadro foralista. Mesmo no caso dos bancos que se dediquem a trocar as notas emitidas pelas várias instituições espalhadas pelo país, a mesma salvaguarda pode ser adoptada, o que os obrigará a trabalhar em consórcio e a uma maior transparência em relação às contas e, consequentemente, segurança em relação aos câmbios. Se seguirmos por aí, vos garanto que conseguiremos finalmente colocar a banca ao serviço da economia real de facto, tornando a indústria, a agricultura, o comércio e a actividade bancária num todo que cresça em conjunto ao invés de ser o que é hoje: um jogo de soma zero onde os bancos ficam com os lucros e o resto da economia paga pelos prejuízos causados pelos maus investimentos dos mesmos.
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