Seguindo a via "liberalex" ou "socialex", acabaremos assim.
Ao tomar ciência de um artigo de
jornal por intermédio de um post do Orlando Braga (aqui), me deparei com um mais exemplo típico de
periodismo de propaganda, do tipo que visa distorcer a visão do público e induzi-lo ao erro, recorrendo à omissão descarada de todos os factos que ponham em
causa as soluções propostas, implícita ou explicitamente, de modo a facilitar o
avanço de uma agenda claramente desfavorável à maioria.
O artigo citado mente dizendo verdades, repetindo o esquema usado abusivamente pelos liberais.
Ao defender a convergência, o que significa igualar os custos de produção em
Portugal aos dos concorrentes por via da redução dos custos de trabalho, ou
melhor, tornar esses custos menores que os dos concorrentes, o jornalista induz
o leitor a pensar que os custos de trabalho e o salário são a mesma coisa,
quando na verdade o salário é apenas uma fracção dos custos de trabalho.
Dessa maneira, acaba por dar a
ideia de que a única maneira de diminuir os custos de trabalho, o que é bom, é
através da diminuição do salário, o que é péssimo. Tudo isso para poupar o
governo do esforço necessário para diminuir o confisco tributário a que expôs
quase toda a sociedade, com destaque para a classe média com propriedades e
para todas as classes assalariadas, de modo a favorecer os seguintes grupos:
dependentes do estado, burocratas, empresas especializadas em contratos
públicos, monopólios e bancos. E qual é a única alternativa que os mesmos media para as massas dão a conhecer? Continuar tudo na mesma, ou seja, fazer de conta que os custos de trabalho não são altos e limitar a discussão, tal e qual fazem os liberais, ao valor do salário, sem tocar nos outros componentes.
Infelizmente, se quisermos ter condições de
pagar os salários alemães sem levar a economia à falência, e não há alternativa se quisermos lá chegar (estou
convicto de que podemos superá-los em 20 anos), seremos obrigados a superar os
níveis de productividade destes. A questão é saber qual a razão de não termos
os níveis de productividade dos alemães. Para o vulgar economista liberal, que
conhece a actividade económica como um conceito abstracto e nunca acompanhou a
vida de uma fábrica, é fácil culpar os próprios trabalhadores e patrões,
diferindo da crítica socialista apenas pela ênfase diversa que dá ao papel de
cada um desses bodes expiatórios dos seus pecados intelectuais. Porém, a realidade é bem diversa,
e a prova de que é está no facto de que a mão-de-obra portuguesa é valorizada
nos países com alta productividade, muitas vezes sendo preferida à mão-de-obra
local.
Quanto aos empreendedores, basta acompanhar a saga dos aventureiros portugueses em todas as partes do mundo. Muitas vezes olhamos para certos povos como exemplo dessa capacidade, mas a expansão deles é puramente burocrática, ao contrário da nossa, que vai sendo feita por indivíduos que não contam com a ajuda dos seus governos e ou com qualquer tipo de estrutura de protecção. No caso dos suecos, por exemplo, o que vemos são apenas indivíduos recrutados nos seus países pelas multinacionais de origem local, que os mandam para fora. No nosso, são aventureiros, sem medo de estrangeiros e preparados para lidar com eles, que desejamerguer os seus próprios negócios. Mas não é apenas a motivação que conta, e esta conta bem pouco no que toca à questão da produtividade e dos salários nos dias de hoje. É sobretudo o facto de que o estoque de bens-de-capital nos países de grande produtividade é bem maior e a infra-estrutura disponível, especialmente ao nível dos transportes, está noutro patamar, que explica essa diferença. A productividade das nações mais avançadas materialmente é o resultado de décadas de investimentos acumulados e os salários altos são uma consequência disso.
Quanto aos empreendedores, basta acompanhar a saga dos aventureiros portugueses em todas as partes do mundo. Muitas vezes olhamos para certos povos como exemplo dessa capacidade, mas a expansão deles é puramente burocrática, ao contrário da nossa, que vai sendo feita por indivíduos que não contam com a ajuda dos seus governos e ou com qualquer tipo de estrutura de protecção. No caso dos suecos, por exemplo, o que vemos são apenas indivíduos recrutados nos seus países pelas multinacionais de origem local, que os mandam para fora. No nosso, são aventureiros, sem medo de estrangeiros e preparados para lidar com eles, que desejamerguer os seus próprios negócios. Mas não é apenas a motivação que conta, e esta conta bem pouco no que toca à questão da produtividade e dos salários nos dias de hoje. É sobretudo o facto de que o estoque de bens-de-capital nos países de grande produtividade é bem maior e a infra-estrutura disponível, especialmente ao nível dos transportes, está noutro patamar, que explica essa diferença. A productividade das nações mais avançadas materialmente é o resultado de décadas de investimentos acumulados e os salários altos são uma consequência disso.
Por cá só é possível manter e aumentar os salários, sem aumentar o desemprego, diminuindo os custos de
produção, incluindo os de trabalho, afinal, é preciso investimento em máquinas
para aumentar a produção per capita, se considerarmos apenas o que está ao
alcance da acção do empresário, e já não é possível recorrer a mais endividamento para fazer esse investimento. Porém, como o governo não faz a sua parte,
diminuindo os custos trabalhistas e agindo para gerar a queda de alguns componentes
dos custos de produção, como a energia, a única via que sobra é a da diminuição dos
salários.
Mas isso não passa de um
paliativo, afinal, quando os salários chegam a um certo piso, a mão-de-obra,
especialmente a melhor fracção dela, imigrará. Portanto, a única maneira de
diminuir os custos de trabalho de maneira eficaz não pode passar pela diminuição
do salário, mas sim pela diminuição dos outro componentes dos custos laborais,
e isso exige uma reforma do sistema previdenciário, estabelecendo um tecto para
as actuais pensões e acabando com as “pensões políticas”. Porém, uma reforma da
previdência não poderia ficar por aí. Seria preciso pensar em ir adiante e
encontrar uma solução holística, que leve em conta o modelo de família - e de
civilização - que desejamos como padrão, estabelecendo metas mais elevadas do
que a simples victória na competição económica.
Por outro lado, também os outros
componentes dos custos de produção, assim como os de transporte, podem ser
consideravelmente diminuídos se os monopólios no sector energético forem
destruídos, em favor de um regime concorrencial onde as pequenas e médias
empresas fossem o motor do investimento e as empresas públicas regulassem o
mercado naqueles sectores estratégicos que exigem investimentos ainda
proibitivos aos privados (com excepção dos que gozam de boas conexões), e
pensarmos nos transportes sem preconceitos ideológicos.
Temos um excesso de auto-estradas
e faltam ferrovias, aeroportos secundários e portos, para além de não termos
marinha mercante, o que nos reduziu à condição de mercado secundário atendido
pela navegação de cabotagem, quase toda ela nas mãos de capitais estrangeiros.
Hoje, para vergonha dos nossos antepassados, temos de usar os portos espanhóis
e holandeses se quisermos fazer negócios com outros continentes! Pode parecer
que todos os portugueses perdem com isso, mas a realidade é que os Amorins, os Espíritos Santos e os Mexias da vida, gente que, apesar de todas as
facilidades, jamais criou negócios, mas apenas usufruiu do que já estava feito
e só sobrevive nos negócios graças à
protecção estatal, são muito bem remunerados por esse sistema viciado, apesar
de não passarem de empregadinhos bem remunerados quando pensamos nos interesses
que dominam os bancos estrangeiros que têm a banca e as corporações portuguesas
”agarradas pelos tomates”.
A diminuição desses custos relacionados
com a política de preços viciada pelos monopólios e pelo saque fiscal acabaria por
aumentar o valor do salário, sem que este subisse, pois os preços cairiam,
aumentado o valor aquisitivo dos vencimentos auferidos. Basta imaginar o quanto
os portugueses gastam em energia e combustível, e o quanto isso encarece os
productos que eles compram, para se ter uma ideia inicial do ganho que isso
representaria. Seria mal para o Mexia, que teria que assaltar banco para manter
o mesmo padrão de vida, ou para o Miro, que seria obrigado a trabalhar como
assistente de barraca na feira, mas no lugar dessas estrelas de um regime
apagado surgiriam verdadeiros capitães das artes e ofícios.
Somente pelo caminho da redução
dos custos de produção e de transporte, abandonando a tentação liberal de
seguir o caminho da redução de salários, poderão os empresários investir mais,
aumentando a productividade e os empregos e gerando o ciclo virtuoso que leva
ao caminho do aumento de salários paralelo ao crescimento económico. Tal
medida, se correspondida por uma diminuição dos impostos, o que só pode ser
conseguido pelo corte brutal dos gastos públicos de forma a criar um saldo
positvo nas contas públicas que faça desabar os juros sobre a dívida pública,
para além de capitalizar ainda mais as empresas, aumentando o investimento, que
nesse momento é insuficiente para que haja crescimento, aliviará as contas das empresas
e famílias endividadas, afinal, os juros pagos pelo governo indexam os juros
cobrados a todos (funcionam como um piso), aumentando o capital disponível para
o investimento de risco em detrimento do incentivo do consumismo estatal.
Apesar de aceitar algumas “máximas
liberais” no campo restricto da economia, a verdade é que essas não passam de
obviedades que desde sempre estiveram implícitas no que escreveram grandes
pensadores como Aristóteles a respeito do assunto. Só os liberais é que
sentiram pela primeira vez a necessidade de as exprimir, achando que havia
novidade no que diziam, o que de certa forma indica a queda do nível
intelectual da humanidade. Para resumir, diria que naquilo que os liberais estão
correctos, estamos quase sempre ao nível da tautologia.
Voltando ao artigo, o tal
economista fala em convergência entre o sector público e o privado através do
aumento da carga laboral dos funcionários públicos. Aqui estamos diante de mais
um caso de um liberal que dá um tiro no próprio pé, sem reparar nisso. Quando
um dos maiores problemas da nossa economia é o excesso de “trabalho” no sector
público, tudo o que não pecisamos é de
fiscais da ASAE trabalhando ainda mais e, o que é pior, chateados por causa
disso!
O que precisamos é tirar o
excesso de gente do sector público, valorizando os bons sem abandonar os que
não fazem falta ou atrapalham. Mais vale mandá-los para casa com uma plano de
reconversão a outras actividades, pagando os salários, que seriam gradualmente
diminuídos num período determinado, de modo a que não gerar miséria e
desespero. Mais complicado será o caso daqueles que passaram mais de duas
décadas no sector público. A continuação do estado de coisas é uma injustiça,
mas não podemos cometer uma injustiça para com aqueles que terão dificuldades
em se readaptar ou estão quase em fim de carreira. Teremos que considerar os
compromissos que venhamos a assumir com eles, e é possível satisfazer a todos,
como uma dívida. Se fizermos as reformas necessárias, teremos condições de
pagar essa dívida e a vitalidade que tomará conta de Portugal oferecerá perspectivas voluptuosas a esses
concidadãos que hoje levam, e essa é a verdade, uma vida cinzenta.
Essas reformas, impossíveis de
serem conduzidas nestes regime, permitiriam que Portugal contasse com taxas de
crescimento chinês num contexto social tão despreocupado quanto o suíço. Os
funcionários públicos mais jovens que fossem desligados se integrariam rapidamente
noutras actividades e poderiam dentro de alguns anos gozar de um padrão de vida
material, e não só, bem mais alto que o actual, e num contexto de optimismo
quanto ao futuro, ao invés do actual contexto de pessimismo quanto ao futuro
num quadro de escassez.
Todavia, nada disso interessa a
liberais e socialistas. Os primeiros estão interessados em transformar Portugal
num experimento social semelhante ao chinês – mas sem soberania - para provar
que são os liberais mais mauzões do mundo (Complexo de Gordon Gecko), enquanto
os segundos desejam uma sociedade disfuncional que gere as condições necessárias
para uma revolução. Como vimos, há muito mais soluções do que aquelas que essas
doutrinas estrangeiras pregam, ou melhor, a solução não pode ser encontrada
nelas. Porém, para isso é preciso restaurar uma tradição muito portuguesa, a da
inovação, que perdemos quando começamos a imitar, feito uns papagaios, tudo o
que os estrangeiros diziam, como se fossem as suas palavras a razão do que
percebíamos como grandeza nas nações de onde provinham. Assim, o discurso
liberal sobre a inovação é semelhante ao discurso predominante naquelas obras
do tipo “como ficar rico”, ou seja, não passa de retórica de auto-ajuda. Até
hoje não conheci um entre eles que fosse um verdadeiro criador. Entre os que
não se incluem no conjunto “gigolôs do erário”, só encontrei tipos que vivem de
rendimentos ou agem no mercado com informações privilegiadas, e ainda assim não
destoam da média e por vezes cometem erros de avaliação induzidos pela “leitura
ingénua” dos FT e The Economist.
Não é por acaso que foi sob o
liberalismo que ficamos para trás e chegamos ao ponto de ter que aprender
lições sobre a construção naval de dinamarqueses, espanhóis e coreanos, sem poder
aplicá-las. Mas talvez tenha sido essa a grande inovação introduzida pelo
liberalismo. Mas nem tudo foi negativo. Ao menos agora podemos dizer que somos
cosmopolitas e modernaços: compramos aviões americanos, guiamos carros alemães,
ingerimos comida chinesa, conduzimos táxis em Paris, limpamos ruas em Berlim e
recebemos ordens de Bruxelas. Mais cosmopolita do que isso? Só os ciganos.
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