terça-feira, 19 de março de 2019

Nacional-Gnosticismo II: a Metapolítica do Ministro


Desde a mais recente campanha presidencial, o chanceler Ernesto Araújo mantém um blog denominado Metapolítica 17 (referência ao número do então candidato Jair Bolsonaro), que pode ser acessado atualmente no endereço www.metapoliticabrasil.com. Apesar do endereço, a antiga capa e o nome original foram mantidos:
Quando da indicação desse Ministro, Olavo de Carvalho reagiu a uma publicação de Martim Vasques na qual o  ex-aluno e atual desafeto, apelidado de Martim Vaca, teria divulgado os posts de um russo que teria dito que Ernesto Araújo tem ligações com a "nouvelle droite" de Alain de Benoist exatamente por utilizarem, ambos, o termo "metapolítica":


É verdade que, como se lê no printscreen acima, metapolítica é um assunto, não indicando necessariamente a pertença a um grupo específico, mas também é verdade que o termo tem mais de um sentido, e aquele no qual o chanceler se enquadra o aproxima por demais do que pensam e fazem certos "grupos iniciáticos".

É o que se conclui do artigo "O que é Metapolítica?", de Alberto Buela, cuja tradução foi publicada no Brasil em 2014, bem antes, portanto, de tal discussão e evidentemente não influenciado por ela. 




Buela identifica 3 acepções do termo, sendo que somente as duas primeiras flagrantemente divergem das posições exibidas publicamente por Ernesto Araújo: 

A primeira acepção refere-se ao desenvolvimento de uma atividade cultural como "condição prévia e necessária para a tomada do poder político", mas, idealmente - e, segundo Buela, contraditoriamente -, sem qualquer ação política direta. Seria uma absorção do método gramsciano pela direita. Segundo Buela, "[p]oucos são os que sabem que este é o antecedente mais distante da noção de metapolítica que começou a manejar-se em fins dos anos sessenta por um grupo cultural francês conhecido como nouvelle droite".
A segunda acepção é a de uma filosofia política da linguagem sem pressupostos metafísicos, gritantemente oposta à posição do Ministro das Relações Exteriores e à de seu guru. 

Mas há a terceira acepção, que merece uma maior atenção:
"Uma terceira acepção da metapolítica está dada pelo que denomina-se tradicionalismo, corrente filosófica que ocupa-se do estudo de um suposto saber primordial comum a todas as civilizações. Cabe distinguir este tradicionalismo que por definição é ahistórico, da tradição de um povo particular como história de valores a conservar.
O máximo representante desta corrente, neste tema, é o italiano Silvano Panunzio que em sua obra Metapolítica: A Roma Eterna e a nova Jerusalém ocupa-se detalhadamente dos fundamentos da metapolítica e sua funcionalidade em nosso tempo.
Não obstante, é seu continuador o agudo pensador ítalo-chileno Primo Siena, quem melhor define esta significação de metapolítica quando sustenta: "Transcendência e metapolítica são conceitos correlativos, por ser a metapolítica veraz expressão de uma ciência não profana e sim sagrada; ciência que portanto eleva-se à altura de arte régia e profética que penetra no mistério escatológico da história entendido como projeto providencial que abarca a vida dos homens e das nações. Por conseguinte, a metapolítica expressa um projeto que - pela mediação dos Céus - os homens retos esforçam-se de realizar na terra, opondo-se às forças infernais que tentam resistir-lhes."
Sim, aí está a metapolítica condizente com o autor de "Trump e o Ocidente", o entusiasta de autores gnósticos, do defensor do tradicionalismo supratemporal de René Guénon, do dono do blog Metapolítica 17.

Caio Rossi - Publicado originalmente no blogue Pérolas da Nova Direita

segunda-feira, 18 de março de 2019

Nacional-Gnosticismo I: o Chanceler Esotérico




Ernesto Araújo, o chanceler brasileiro indicado por Olavo de Carvalho, notabilizou-se, entre outras razões igualmente controversas, por ter enaltecido o "Deus de Trump", que, segundo Araújo, "não é o Deus-consciência cósmica", mas "o Deus que age na história, transcendente e imanente ao mesmo tempo".

No mesmo ensaio, intitulado "Trump e o Ocidente", ele diz acreditar haver "ecos guenonianos" no discurso de Trump em Varsóvia, atribuindo-os à influência de Steve Bannon, então seu estrategista.


Bannon é, de fato, influenciado não só por René Guénon, como também por Julius Evola, mas, mesmo que nos esforcemos em considerar a fé de Trump algo genuíno (convicção religiosa essa que parece ainda mais cínica quando o vemos e ouvimos falar dela, como no vídeo abaixo), não é verdade que o conceito de Deus em Guénon sequer se assemelhe à concepção cristã ou especificamente católica, ao contrário do que afirma Araújo.







Em uma entrevista, reproduzida no vídeo acima e mencionada em um artigo do Washington Post, Trump diz que "Deus criou isso [apontando para seu campo de golfe e a natureza em volta], e está aqui o Oceano Pacífico bem atrás de nós".


Para René Guénon, 'criação" divina era um conceito inferior, exotérico, e, mesmo assim, típico somente das 3 tradições de origem semita (que ele chamava, com desprezo, de "religiões").

Guénon cria no emanacionismo. E cria não só que o universo teria emanado da Divindade - e não sido criado por Ela -, mas que os diferentes nomes divinos seriam referências também a diferentes manifestações hipostáticas dessa Divindade. Mais especificamente, Guénon escreveu, em O Rei do Mundo, que o El Élyon, o Deus Altissimo de Melquisedeque, seria o mesmo Emmanuel a que Cristo se referia, mas que esse seria superior a El Shaddai, o Todo Poderoso que se manifestou a Abraão.



Mas é difícil acreditar que Ernesto Araújo ignorasse isso tudo.

Araújo é autor de 3 livros de ficção. Um deles é intitulado Quatro 3, que escreveu quando "servia na embaixada em Berlim". Em entrevista sobre o livro publicada no site da própria editora, há um trecho que demonstra sua familiaridade com o gnosticismo, e evidente simpatia para com a heresia:

Alfa Omega: Seu livro também fala muito de deus.

Ernesto Araújo: Sim. Outro ponto que procuro trabalhar é a idéia da fragilidade de deus. Acho necessário contestar a concepção de deus como administrador do universo, e propor aquela de deus como prisioneiro desse mesmo universo. Precisamos resgatar a visão gnóstica do “deus que sofre”, e esquecer a figura do deus-juiz, do legislador cósmico vigiando e punindo.

Esse livro foi publicado 18 anos antes que ele se tornasse  nosso chanceler. Poderia refletir somente uma fase gnóstica na juventude, mas as muito mais recentes referências positivas a René Guénon, Julius Evola, Vitor Manuel Adrião e Carl Jung em "Trump e o Ocidente", além de sua ligação com Olavo de Carvalho, sugerem, ao contrário, um aprofundamento em suas convicções.

Caio Rossi - Publicado originalmente no blogue Pérolas da Nova Direita

segunda-feira, 11 de março de 2019

Pérolas da Nova Direita: As 4 Vertentes do Governo Bolsonaro.




A candidatura de Jair Bolsonaro foi resultante da confluência de 4 vertentes, cada uma composta pelos seguintes grupos:
1. Os militares, que formam o "núcleo duro" do Governo.
2. Os evangélicos, dado seu potencial de atrair votos.
3. Os liberais globalistas, que, através da figura de Paulo Guedes, levaram o candidato para as "altas rodas" financeiras internacionais e fizeram com que abandonasse o discurso nacionalista.
4. As olavettes, que prometiam oferecer ao novo Governo a "sabedoria" que, acreditaram o candidato e pelo menos dois de seus filhos, fluiria como uma seiva divina a partir da Virgínia e, mais recentemente, da "Internacional Nacionalista" de Steve Bannon.
O Governo não sobrevive sem a vertente militar e a evangélica, que compõem seu kit básico de sobrevivência.
Por determinação dos militares, ele está tendo de se livrar do fiasco da 4ª vertente, o que vem ocorrendo sob aplausos aliviados dos liberais globalistas, que, por sua vez, se tornarão, em breve, a única força interna com o potencial de se contrapor aos militares (já que a agenda dos evangélicos se resume praticamente ao anti-esquerdismo e às pautas morais, podendo se moldar ao que restar).
E é nesse ponto que os militares têm de ficar muito atentos, pois os liberais, para garantirem que seus verdadeiros patrões possam se refestelar com o botim nacional, poderão fomentar as críticas da vertente olavette - que já está tentando colocar a população contra os militares antes mesmo de ser escorraçada do barco -, e qualquer sucesso nessa empreitada tenderá a fortalecer o poder desses liberais sobre as decisões do Governo.
Por isso, é importantíssimo que o núcleo duro mantenha canais abertos com russos e chineses, até porque são a única vertente com a disposição de fazê-lo preservando os interesses nacionais, e o farão caso não queiram que viremos a próxima Venezuela.


Por Caio Rossi - Publicado no Blogue Pérolas da Nova Direita